Princípio Estoico #3: Concentre-se no que pode controlar, aceite o que não pode

“Das coisas existentes, algumas são encargos nossos; outras não. São encargos nossos o juízo, o desejo, a repulsa –em suma: tudo quanto seja ação nossa. Não são encargos nossos o corpo, as posses, a reputação, os cargos públicos –em suma: tudo quanto não seja ação nossa. ” Manual de Epicteto [1.2]

Esta passagem é encontrada logo no início do Enchirídion de Epicteto, porque é fundamental para os ensinamentos da Filosofia Estoica. É denominada “dicotomia estoica do controle“, o princípio mais característico do estoicismo. Devemos distinguir cuidadosamente o que é “nosso encargo“, ou seja, algo sob nosso próprio poder, e o que não é. São nosso encargo nossas escolhas voluntárias, a saber, nossas ações e julgamentos, enquanto todo o resto não está sob nosso controle. O artigo “O que são coisas indiferentes no estoicismo de Epicteto e qual a atitude correta diante delas
por Aldo Dinucci, tradutor do manual, é muito clarificador.

Até nosso corpo não depende de nós, ou pelo menos não inteiramente. Sim,  há muitas coisas que podemos fazer para obter um corpo saudável e atraente. Mas isso só é possível até certo ponto. Podemos controlar nossas ações e manter uma dieta saudável, exercitar sistematicamente e sermos ativos, mas não temos controle sobre outras coisas, como genes e fatores externos, como doenças e lesões .

Só controlamos nossas próprias ações e temos que aceitar o resultado com equanimidade. Teremos satisfação e confiança de saber que estamos fazendo o melhor e tentando tudo o que estiver ao nosso alcance para atingir nosso objetivo. Então,  podemos aceitar o resultado porque fizemos nosso melhor. Se o resultado não é satisfatório, devemos aceitá-lo facilmente e dizer: “Bem, eu fiz o meu melhor”.

Os estoicos usam a Analogia do Arqueiro para explicar isso:

Um arqueiro está tentando atingir um alvo. Ele tem uma série de coisas sob seu controle, como o treinamento, qual arco e flecha usar, quão bem apontar e quando soltar a flecha. Então ele pode fazer o seu melhor até o momento em que a flecha deixa seu arco.

Agora, ele atingirá o alvo?

Isso não depende dele. Afinal, uma rajada de vento, um movimento súbito do alvo, ou algo pode entrar entre a flecha e o alvo. E o arqueiro estoico está pronto para aceitar todos os resultados possíveis com tranquilidade, porque ele fez o seu melhor e deixou o resto (o que ele não podia controlar) para a natureza.

Massimo Pigliucci coloca em seu livro How to Be a Stoic:

“Este é precisamente o poder do estoicismo: a internalização da verdade básica que podemos controlar nosso comportamento, mas não os seus resultados – e muito menos os resultados dos comportamentos de outras pessoas – o que leva à aceitação tranquila do que acontece, assegurando o conhecimento de que nós fizemos o nosso melhor, tendo em conta as circunstâncias”.

E o que sempre podemos tentar o nosso melhor? viver de acordo com a virtude. Sim, podemos sempre tentar aplicar a razão, atuar com coragem, tratar com justiça e exercitar a moderação.

Vejamos um dos exercícios práticos recomendado por Epicteto:

“Faça uma prática dizer a todas as impressões fortes: ‘Uma impressão é tudo o que você é’. Em seguida, teste e avalie com seus critérios, mas um principalmente: pergunte: ‘Isso é algo que está ou não está sob meu controle?’ E se não é uma das coisas que você controla, diga: ‘Então não é minha preocupação’.  Epicteto – Discursos (II.18)

Se é seu encargo, então faça algo sobre isso, se não, aceite como está.

As coisas que dependem de você, ou seja seus pensamentos e ações, são as coisas mais importantes. Donald Robertson disse isso bem em seu livro Estoicismo e Arte da Felicidade:

“A conclusão filosófica de que o principal bem, o mais importante na vida, deve necessariamente ser aquilo que está a “nosso encargo” é ao mesmo tempo o aspecto mais difícil e mais atraente do estoicismo. Isso nos torna completamente e totalmente responsáveis pela nossa vida, privando-nos de desculpas para não florescer e alcançar a melhor vida possível, porque isso está sempre ao nosso alcance “.

Então, a lição chave para tirar aqui é concentrar nossa atenção e esforços onde temos mais poder e deixar o universo cuidar do resto.


Princípios Estoicos:


Livros citados:

            

Princípio Estoico #2: Viva pela Virtude

Alcançar a “virtude” é o bem mais elevado.

O que os estoicos denotavam como “virtude” era sobressair ou florescer em termos de nossa natureza humana racional. Basicamente, quando você vive de acordo com a virtude, você está vivendo a Boa Vida. Essa excelência humana se dá em diferentes formas de virtude destacada nas quatro virtudes cardeais:

  • Sabedoria prática: a habilidade de navegar situações complexas de forma lógica, informada e calma;
  • Autodisciplina ou Temperança: o exercício de autorrestrição e moderação em todos os aspectos da vida;
  • Justiça: tratar outros justamente mesmo quando fazem algo errado;
  • e Coragem: não só em circunstâncias extraordinárias, mas ao encararmos desafios diários com claridade e integridade.

Quando agimos de acordo com essas virtudes, caminhamos para a Boa Vida. No sentido estoico, você só pode ser virtuoso se praticar todas as virtudes. A virtude é um pacote tudo-ou-nada e somente um Sábio as têm completamente. É importante entender que o conceito “sábio” para os filósofos antigos é um ideal a ser atingido, e não alguém real. Segundo Sêneca o sábio se equivale aos deuses, com a única distinção do sábio ser humano e mortal.

Para os estóicos, é indiscutível que a virtude deva ser sua própria recompensa. Você faz algo porque é a coisa certa a fazer. Você age virtuosamente por sua própria causa.  Às vezes, agir de acordo com a virtude traz benefícios adicionais,  no entanto, esses benefícios devem ser interpretados como “bônus adicional” e não podem ser o principal motivo da ação.

(Imagem: Escolha de Hercules entre a Virtude e Vício por Pelagio Pelagi)

 


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Princípio Estoico #1: Viver de acordo com a natureza – O objetivo estoico de vida

O objetivo derradeiro da vida de acordo com todas as escolas de filosofia da Grécia antiga é a Eudaimonia. Pense nisso como sendo suprema felicidade ou realização alcançável por seres humanos. A Boa Vida – uma vida prospera, elevada e fluindo em harmonia.

O objetivo da vida = A Boa Vida. Como viver para atingir a “Boa Vida”?

Os estoicos apresentaram muitas estratégias práticas para avançar para a Boa Vida. Examinaremos estratégias e ideias específicas nos próximos princípios. Primeiro, vamos aprender como os estoicos resumiram o objetivo de vida:

“Viver de acordo com a natureza”

Viver de acordo com a natureza” era um slogan central do estoicismo, mas requer uma explicação adicional, uma vez que levanta a questão: “O que exatamente isso significa?” Epiteto dizia:

“Então, o que é um Homem? Um animal racional, sujeito à morte. Perguntamos, de que o elemento racional nos distingue? De bestas selvagens. E de que mais? De ovelhas e similares. Atente-se para que você não faça nada como uma fera, senão você destruirá o Homem em você e não atingirá seu potencial. Veja que você não haja como uma ovelha, ou então o Homem em você perece.
Você pergunta como agimos como ovelhas?
Quando consultamos a barriga ou as nossas paixões, quando nossas ações são aleatórias ou obscenas ou irrefletidas, não estamos caindo para o estado das ovelhas? O que destruímos? A faculdade da razão. Quando nossas ações são agressivas, prejudiciais, irritadas e grosseiras, não decaímos e nos tornamos animais selvagens?”

O ser humano é um animal racional. Isso é o que nos separa de ovelhas e bestas selvagens. Nós somos diferentes de todas as outras espécies no planeta Terra, tanto para o bem como para o mal. O ponto central é nosso intelecto, nossas habilidades sociais e mentais.

“Viver de acordo com a natureza” trata-se de se comportar de forma racional como um ser humano, ao invés de aleatoriamente (ou por paixão e desejos) como uma fera. Em outras palavras, sempre devemos aplicar nossa habilidade natural da “razão” em todas as nossas ações. Se aplicarmos a razão viveremos de acordo com a natureza, agindo como seres humanos devem agir.

(imagem, Olivia Beaumont | The Baroque Beasts)


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